É FODA!
É foda. Você chega em casa depois
de alguns dias de desligamento e relaxamento em um rolê louco com os seus e dá
de cara com o stress concentrado da megalópole e da guerra civil/étnica
instaurada pelo estado, ou melhor dizendo, extermínio.
Num piscar a megalópole te rouba
a brisa. Desde a brisa da menina, que saindo do mar jogando o cabelo afro, te
leva a imaginar a Rainha Oxum (sei que Oxum é a rainha das águas doces, mas foi
quem me deu a impressão de ver naquele momento) à energia ancestral emanando na
roda de samba com a juventude cantando junto e em reverência aos mais velhos da
comunidade. É colocar o pé na megalópole que ela te rouba a brisa de um role
louco com encontros, pessoas, momentos e trocas enriquecedores.
Você chega do rolê e vai caminhando
na madrugada pelas quebradas a caminho de casa. E no caminho pensa... sempre
curti andar de madrugada pela cidade e de repente começa a perceber a energia
tensa emanando das ruas e paredes da selva de pedra, ruas e paredes banhadas do
suor e sangue d@s Noss@s. E sem nenhuma intenção, automaticamente, todos os
instintos de sobrevivência adquiridos durante a trajetória de vida são
ativados.
Logo após isso, você vê uma mano
andando na mesma direção a sua frente com uma garrafa na mão, ele olha para
trás e te ganha, pára, olha para um lado, para outro te fita nos olhos e
continua olhando para os lados como se estivesse garantindo que não havia mais
ninguém ali. Ele fica parado até você chegar nele te fitando nos olhos. É
inevitável a malícia adquirida nas ruas da quebra te faz perceber uma certa
maldade no gesto do mano, e então você se prepara para o embate reerguendo e
reforçando todas suas barreiras e instintos. A caminhada continua no mesmo
ritmo o mano continua parado te fitando, mas agora você já se armou, mudou o
olhar, a postura, caminha com passadas firmes e cabeça erguida fita o olhos sem
desvios, sem mostrar receio ou dúvida, agora já demostra tanta ou mais
disposição do que o mano e com olhar e expressão corporal diz sem dizer, 'o que
você quiser eu quero em dobro". Depois disso, já perto do mano com a voz
firme e forte antes que ele diga você diz: SALVE! QUE QUE PEGA? Ta aí vacilando
sozinho na rua mano? E o mano embriagado fica sem ação. Você passa por ele, ele
fica parado por um tempo te fitando com olhos, você segue seu caminho e agora,
ele o dele.
O dia amanhece... aí você fica
sabendo que no feriado de nossa senhora, difundido pela publicidade da
industria do comércio como dia das crianças, uma mulher e um adolescente (sua
criança) foram espancados, torturados em plena luz do dia no meio da rua por
policiais, provavelmente uma mãe que foi defender o filho de mais uma de tantas
ações arbitrárias da polícia aqui e em todas quebradas do Brasil.
No dia das crianças as Nossas
receberam de presente do estado spray de pimenta.
E a coisa não para por aí, você
fica sabendo, que a polícia jogou o carro em cima de dois jovens de moto,
espremendo os dois contra outro carro para DEPOIS, DEPOIS e só DEPOIS, ser
averiguado que ambos não deviam nada e não estavam armados.
Além disso, te contam que uma
mulher bêbada atropelou e matou uma criança de três anos e a população
revoltada queria fazer justiça ali mesmo. Mas a motorista bêbada que assassinou
a criança sumiu.
Ah, e também, por último mas não
menos importante, descobre que sua avó esta internada no hospital com problemas
respiratórios, provavelmente uma recorrência de um problema de saúde já
'tratado' pelo serviço de saúde do estado.
Tudo isso no primeiro dia que
você retorna a quebrada, ao lar.
E isso, só mostra que esses rolês
para desligamento e relaxamento são cada vez mais necessários. Porém a
realidade faz questão de te mostrar e falar: "ACORDA JÃO!!! NÃO SONHA
MUITO NÃO, pé no chão, pé na terra".
Mesmo assim, o sonho segue! A
luta segue!
SP/capital - "Zona sul é
stress concentrado" e o mais triste é saber que todas as quebras do Brasil
a situação não é diferente.
Fim de feriado prolongado. Bem
vindo ao lar!