quinta-feira, 8 de setembro de 2011

REALMENTE VERGONHOSO - Resposta ao artigo publicado no site da revista veja




A mídia global não perde a oportunidade de atacar o MST, um dos mais importantes movimentos populares que luta bravamente no dia-a-dia sem nenhuma visibilidade positiva na mídia. Só aparece na mídia burguesa e coorporativista em tentativas de criminalização desse movimento, um dos mais autênticos entre os movimentos populares deste país. E em tentativa de diminuir ou anular sua importância, sem medida, para as famílias, trabalhadores rurais e na luta incansável pela reforma agrária, política (lutando contra a corrupção) e justiça social deste país ENTRE MUITAS OUTRAS COISAS. Vergonhoso é essa mídia hipócrita e sem ética, e seus maus "profissionais" de postura, no mínimo, duvidosa, que com suas falácias manipulam a opinião pública e tentam criminalizar movimentos populares autênticos. Essa mesma mídia, que quando escuta falar de regulação e democratização dos aparelhos de comunicação treme. Isso Sim é vergonhoso.

LIBERDADE DE EXPRESSÃO SIM, mas com responsabilidade e compromisso com a verdade.



P.S. As marchas são de valores inestimáveis e sempre serão bem vindas. Mas sempre desconfio de "marchas" patrocinadas por essa mídia suja e sem compromisso com a verdade.


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Projeto Rua D'Arte: Graffitagem a todo vapor: No último final de semana, depois de estudarmos algumas técnicas de spray e  estêncil nas oficinas anteriores, educandos(as) e educadores...


Um pouco da prática educativa...



quarta-feira, 13 de abril de 2011

Hip Hop é COMPROMISSO



Resposta a matéria O Rap saiu do gueto da revista época
Por Anderson Benelli

Nossa que matéria alienada e alienadora, ao que parece, escrita por quem não sabe nada da cultura Hip Hop, com um recorte que induz o conflito entre as diferentes vertentes do Rapbr.

 A diversidade musical, de ritmos e temas é, e sempre será, bem vinda, mas reduzir o RAP e o movimento Hip Hop a publicidade de marcas famosas, como diz a matéria, reforçando ainda mais a alienação do sistema capitalista consumista, "porque as minas gostam", o tornando mais uma ferramenta de alienação no mercado da música e nas mãos da elite, é uma vergonha.
 Está claro, que a mídia e o mercado da música e seus produtores estão se esforçando para esvaziar o rap e o movimento Hip Hop através de uma higienização, como  fizeram com o samba, o tornando mais um produto de embalagem bonita na pratileira sem nada a dizer.
Além disso, tentam rachar o movimento incitando preconceito (uma das causas de engajamento da qual o movimento luta para eliminar) e mal estar entre as diferentes linhas de abordagem do RAP e seus artistas e militantes.
 É claro que a maneira de se fazer RAP mais radical, indignada e direta vai ser criticada. Pois ela fala diretamente ao povo oprimido, instigando à reflexão e conscientização sobre as injustiças sociais impostas por um sistema escravocrata. Essa conscientização é uma  ameaça a hegemonia da classe dominante que teme toda manifestação subversiva que propõe mudança. O que eles pretendem com isso? Abafar a voz do povo,  garantindo o sucesso da cultura do silêncio nos negando o direito a palavra. Mantendo assim, a estrutura de nosso sistema social.
 Além disso, o amor e amizade sempre foram abordados no RAP durante toda década de 1990, toda e qualquer manifestação indignada com as injustiças sociais se funda no amor, mesmo que seja expressada de forma radical e rebelde.
 Criticar a linha mais pesada do RAP que deu a cara a tapa e sofreu com preconceitos tornando a visibilidade e o espaço que essa nova geração esta tendo possível, é no mínimo ingratidão.
 Há inúmeras maneiras de se abordar um mesmo tema e todas elas são válidas não existe melhor ou pior cada um segue sua linha. E se as injustiças sociais existem, e não se enganem elas estão tão presentes quanto antes, elas devem ser tema, sim, de um movimento cultural que lutou e LUTA pela liberdade, igualdade de oportunidades e tratamento. Mesmo que abordada de formas diferentes. Quanto mais diversidade de temas e abordagens, dos velhos e mesmos problemas que persistem em nossa sociedade, melhor.
  O único Rap que explora a miséria é aquele que sobe sustentado pelo povo e ao subir vira as costas para a periferia que tornou essa ascensão possível. 
 A expansão da cultura Hip Hop para outras classes sociais é positiva e até natural, o que é negativo, é dizer que a cultura saiu do gueto, como sugere a matéria, é querer centralizar a cultura e passar a negar a periferia, quem fizer isso vai cometer um suícidio. O modismo passa.
  A diversidade e mudança, se ocorridas de forma natural, agregam valor e não devem ser criticadas, há espaço para todos.
 Agora, aos que estão se preocupando em vender seu peixe forçando uma mudança para se adaptar ao mercado e pregar a alienação consumista do capitalismo selvagem, ao invés de conscientização, digo que não foi rebolando que um grupo de RAP vendeu 500 mil cópias em uma semana e mais de 1 milhão e 500 mil cópias de um disco. E ao contrário do que alguns pensam, não foi graças a classe média, é bom lembrarmos que só na região do Jd. Angela na zona sul de São Paulo temos, aproximadamente, um milhão de habitantes.

É bom lembrarmos " O ser humano vive da dignidade e não da aparência". Por isso, por favor, não vamos reduzir um movimento cultural pela liberdade a mais uma ferramenta de alienação e manipulação.

Lembrem-se: Cultura Hip Hop é COMPROMISSO com os injustiçados e oprimidos do mundo. 

sábado, 12 de março de 2011

EDUCAÇÃO E COMUNIDADE



A escola e o contexto local

Por Anderson Benelli

É muito comum ouvirmos educadores(as) e pais dizerem que a escola – e com escola quero dizer os seres humanos que a compõem, assim como a cidade, ela não é feita de concreto e sim dos seres humanos que formam essa sociedade - é nossa segunda casa e, por isso, devemos respeitá-la. Mas que casa é essa onde a palavra de ordem é não? Onde educandos(as) não podem exercer o seu direito a palavra e nem fazer nada no qual se reconhecem?
Os(As) educandos(as) não se reconhecem na escola, porque a escola ainda não se reconhece como parte da comunidade que está inserida, se o museu é o mundo como diz Hélio Oiticica[2], a escola também o é. E é no mundo que se faz o processo de ensino/aprendizagem aprendemos em contato com o mundo e com o outro como bem disse Paulo Freire.
Durante o debate Além dos muros da escola que ocorreu no Terreiro[3] Eu sou a Rua na 29ª Bienal de São Paulo uma educadora disse que a escola é desestimulante para os(as) alunos(as) por três fatores: é todo dia, é obrigatória e é um espaço coletivo. Por ser uma atividade rotineira em um espaço coletivo eu não posso expressar minha identidade como indivíduo? Isso não parece o suficiente para justificar o desinteresse de grande parte dos(as) educandos(as), já que durante toda vida convivemos coletivamente cumprindo com obrigações rotineiras. O ser humano chega ao mundo já inserido em uma pequena sociedade, a família. Depois vem o convívio com irmãos, parentes, amigos, desafetos, etc. Ou seja, obrigatoriamente vivemos todos os dias coletivamente e nem por isso a vida é desestimulante, a não ser que o indivíduo esteja sofrendo de desesperança e/ou depressão. A escola é o lugar onde fazemos novas amizades, lugar de encontros com colegas, amigos(as), namoradas(os). Como um lugar que proporciona tantas experiências e encontros interessantes pode ser tão desestimulante?
Infelizmente, muitas escolas ainda não se reconhecem como parte da comunidade, automaticamente, a comunidade não se reconhece na escola e, consequentemente, os(as) educandos(as) como indivíduos dessa comunidade também não. Ao que parece, os maiores responsáveis por esse ambiente opressivo em sala de aula que afasta os(as) educandos(as) são: o currículo, o projeto pedagógico e a metodologia de ensino de alguns professores, dos quais muitos também foram vítimas de um ensino/aprendizagem opressor. E exatamente por isso, uma parte considerável deles não tem consciência crítica desse fato. E por sofrerem com uma educação “bancária” tratados como recipientes vazios a receberem conhecimento como depósito, acabam ensinando como aprenderam. Essa educação não interessa ao povo, além de não estimular a reflexão, faz o oposto, a inibe, reprimindo a autonomia e rebeldia, qualidades de valor imensurável no engajamento por mudanças. Essa educação resulta na preservação da hierarquia social. Porque “caminhos permitidos são rotas de escravidão e caminhos proibidos são rotas de libertação” (Fora de Frequência, 2010.), se repudia a rebeldia que estimula a autonomia e consciência crítica. Ou seja, essa educação “bancária” defende os interesses da classe dominante, inibindo a reflexão, a consciência crítica da realidade, a autonomia, o exercício da palavra dos oprimidos. Com isso, forma-se um povo domesticado facilitando a manipulação da opinião pública e a distorção da realidade social. Evita-se assim, que o povo enxergue as injustiças sociais e se rebele na luta por transformações contra um sistema social escravocrata.
Os muros que isolam a escola são muito mais que barreiras físicas, o muro físico é insignificante perto dos muros que muitos não conseguem ver, a escola ainda é uma instituição de controle onde indivíduos entram diferentes para saírem iguais. A igualdade que nós educadores(as) devemos buscar é a igualdade heterogênea, ou seja, a igualdade de respeito mútuo das diversidades e não a igualdade  de cultura homogênea. Como atender as necessidades das diversidades culturais dos(as) educandos(as) e tornar o ensino/aprendizagem mais significativo?
Precisamos ter como conteúdo de ensino o foco de interesse dos(as) educandos(as) em uma abordagem interdisciplinar e intercultural. O grande problema nesse sentido é que parte dos(as) professores(as) ainda temem as manifestações culturais de interesse dos jovens por terem sido ensinados a temerem a rebeldia e subversão. As manifestações juvenis, normalmente, são carregadas dessas duas qualidades, o que reforça a necessidade de serem exploradas. Pois, essas são qualidades indispensáveis para um ensino/aprendizagem que valoriza a autonomia e consciência crítica dos(as) educandos(as). Está errada a educação que não reconhece na justa raiva, na raiva que protesta contra as injustiças, contra a deslealdade, contra o desamor, contra a exploração e a violência um papel altamente formador”.
Por que a rua atrai mais do que a escola?
Os(As) educandos(as) esperam da escola que ela seja um território de liberdade, essa expectativa aumenta quando o(a) aluno(a) também se sente oprimido em casa, e a escola deve ser esse território de liberdade. Porém, é importante que não confundamos liberdade com algazarra, a escola temendo a segunda se torna o oposto, um lugar de repressão.
A rua permite que o sujeito exercite sua autonomia resolvendo conflitos, vivenciando diversas experiências em contato com o outro e a realidade com a qual se identifica e, através de diferentes manifestações exerça sua palavra e, consequentemente, seu direito de “ser mais”. Ou seja, a rua se torna esse território de liberdade onde o indivíduo pode fazer suas próprias escolhas com as quais se identifica, rebelando-se contra os dogmas instituídos por um sistema social opressor, o indivíduo se sente livre ou pelo menos se libertando. Mas, como fazer da escola um território de liberdade?
É preciso eliminar as fronteiras entre a rua e a escola, entre a realidade e a educação. Os(As) educadores(as) precisam tomar como temas de seus projetos pedagógicos o foco de interesse dos(as) educandos(as), a rua os atrai mais do que a escola porque essa propicia o contato direto com esses temas e com a realidade.
É contraditório se pararmos para pensar que os círculos de cultura filosóficos de Sócrates e seus companheiros foram a base referencial da academia, já que essa, parece fazer o oposto em sua proposta. Enquanto nos círculos filosóficos que geravam debates conceituais sobre a condição humana no mundo e em convívio com o outro, onde todos ouviam e exercitavam a palavra. Nas escolas as carteiras são dispostas em fila com olhar dos(as) alunos(as) em direção ao mestre que, como um santo em um altar descarrega seu sermão que não deve ser interrompido pelos fiéis, deve ser ouvido sem questionamento porque o que ele diz é a verdade divina.
Nós educadores(as) precisamos repensar nossa prática de ensino/aprendizagem, nos apropriarmos das novas tecnologias, da rua e da realidade. E a partir dos focos de interesse dos(as) educandos(as) problematizar nossa condição social no mundo e com o outro derrubando as fronteiras entre educação e realidade, escola e comunidade, educadores(as) e educandos(as). Assim, conseguiremos fazer do processo de ensino/aprendizagem algo realmente significativo, tanto para educandos(as) quanto para educadores(as), transformando a escola em um lugar de pertencimento, não só do educando(a) mas, de toda comunidade, formando sujeitos conscientes e engajados em busca de mudanças e melhores condições sociais para todos.






[2] Artista brasileiro que fez parte do grupo Neoconcreto e do movimento da Nova Objetividade composto por Ferreira Gullar, Lygia Clark, Lygia Pape, entre outros artistas. Para saber mais pesquise sobre o assunto.
[3] Nome dado pela curadoria da 29ª Bienal de São Paulo à seis instalações de diferentes artistas que relacionam poeticamente as obras que fazem parte desses Terreiros. O termo Terreiro é usado como lugar de convívio, festejos e diálogos e não existe tradução para outra língua por só conter significado no Brasil e em Angola.



sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

REFLEXÕES SOBRE A ABORDAGEM TRIANGULAR





Por Anderson Benelli


O processo da Abordagem Triangular[1] teve início na década de 1980 e foi sistematizada no período de 1987/1993 no Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP. Essa proposta surge da necessidade de uma prática de ensino pós-moderno de arte e da procura de uma alternativa para prática de livre expressão do ensino moderno de arte que já não corresponde as inúmeras tendências e aspectos da realidade contemporânea. A Proposta Triangular de Ana Mae Barbosa é hoje a principal referência do ensino da arte no Brasil. Essa proposta procura englobar vários pontos de esino/aprendizagem ao mesmo tempo, entre os principais estão: leitura da imagem, objeto ou campo de sentido da arte (análise, interpretação e julgamento), contextualização e prática artística (o fazer).

 

6.1 - Leitura de imagens, contextualização e prática artística


 Em nossa vida diária, estamos rodeados por imagens impostas pela mídia, vendendo produtos, ideias, conceitos, comportamentos, slogans políticos etc. Como resultado de nossa incapacidade de ler essas imagens, nós aprendemos por meio delas inconscientemente. A educação deveria prestar atenção ao discurso visual. Ensinar a gramática visual e sua sintaxe através da arte e tornar as crianças conscientes da produção humana de alta qualidade é uma forma de prepará-las para compreender e avaliar todo tipo de imagem, conscientizando-as de que estão aprendendo com estas imagens. (BARBOSA, 1998, p. 17).


 Como disse Ana Mae saber ler imagens na contemporaneidade é fundamental, somos bombardeados por estímulos imagéticos o tempo todo, seja através da publicidade, na política, no supermercado, na Internet, acabamos recebendo a maioria dessas imagens de forma inconsciente e acrítica. Muitos membros de nossa sociedade, não só as crianças, ainda desconhecem e/ou menosprezam o poder da imagem e precisam se conscientizar do real valor de se saber ler essas imagens.
 As imagens são usadas para alienar o povo desde os primórdios da humanidade, no Egito era usada para reafirmar a ‘divindade’ dos faraós e manter seu poder, na era bizantina e no Renascimento obras de arte com imagens de santos eram usadas para converter e manter os fiéis submissos a igreja. Na modernidade com a industrialização e a supremacia de um sistema capitalista baseado no consumo, para vender grandes quantias de produtos a publicidade se articula e com a chegada do aparelho de televisão, a relação com a imagem tornou-se ainda mais intensa e fugaz fazendo do saber ler imagens indispensável para a reflexão crítica da realidade.
 No processo de educação do olhar, e em todo processo de ensino/aprendizagem, a postura do(a) educador(a) na mediação de leituras de imagens deve sempre partir de uma abordagem problematizadora instigando o olhar, a reflexão respeitando as interpretações e julgamentos dos(as) educandos(as), o educador(a) não é dono do saber e da verdade e deve estimular e respeitar a autonomia dos(as) educandos(as).
 A contextualização de uma leitura de obra de arte não tem a obrigatoriedade de limitar-se a biografia do artista ou a história da arte, mas é importante esclarecer que também não as negamos quando estas se fazem necessárias para facilitar a análise da imagem.
  Já a partir do fazer artístico espera-se proporcionar uma vivência e experiência durante toda a produção tornando o processo de ensino/aprendizagem completo e significativo para os(as) educandos(as) aplicando na prática os conceitos estéticos e poéticos abordados durante a leitura e contextualização.

6.1.1 - Possíveis influências da Proposta Triangular


Alguns teóricos acusam a Proposta Triangular de ser cópia do Discipline-Based Art Education (DBAE) norte-americano, o que parece ser uma acusação, no mínimo, ingênua. O DBAE é sim uma das referências dessa abordagem, segundo a própria Ana Mae, junto com o Basic Design Moviment inglês e as Escuelas al Aire Libre do México com sua proposta de educação libertária. Mas, não é preciso ir tão longe para buscarmos, o que parece ser, a principal referência dessa abordagem de ensino/aprendizagem da arte proposta pela educadora, basta olharmos para o nosso ‘terreiro’.
 Como a principal referência desse trabalho é a pedagogia freireana, e valendo-se do conhecimento de que a educadora Ana Mae foi aluna do professor Paulo Freire e só passou a se interessar por educação a partir desse contato. Não é difícil deduzir e perceber, em uma análise comparativa, que a principal e mais forte referência da Abordagem Triangular de Ana Mae é o pedagogo Paulo Freire.
 Ao analisar a proposta se estabelece nesta pesquisa relações com a pedagogia de Freire que também propõe uma ‘abordagem triangular’ no processo de ensino/aprendizagem e seus pontos principais são: leitura de mundo, conscientização crítica a partir da contextualização da realidade dos(as) educando(as), e agir para transformar, ou seja, fazer. Apesar de Freire ter desenvolvido sua metodologia e teoria pedagógica em um campo mais amplo, e nunca ter se referido diretamente a especialidade do ensino da arte é bom lembrar que o pedagogo se valia de leitura de imagens com situações do cotidiano dos(as) educandos(as) para alfabetizar adultos em zonas rurais. Essas imagens eram acompanhadas por uma palavra geradora, por exemplo, a imagem de um menino em um determinado contexto cotidiano aos educandos(as) com a palavra menino logo abaixo. Essa imagem e essa palavra desconstruídas e decodificadas a partir de uma abordagem problematizadora geravam outras palavras ligadas ao contexto sociocultural dos educandos resultando em diálogos e reflexão crítica sobre a realidade e condições sociais ao quais eram submetidos. Ao mesmo tempo em que, se conscientizavam e se reconheciam como produtores de cultura deixando de ter um pensamento e/ou postura de inferioridade em relação a classe dominante. Ou seja, uma construção do orgulho e do poder popular através da educação partindo de leitura de imagens, contextos históricos, políticos, sociais etc. propondo uma ação, um movimento em direção a mudança para transformar essa realidade.
  Em sua proposta Ana Mae aplica os ensinamentos do mestre explorando as potencialidades de sua proposta pedagógica de forma atualizada transpondo ao contexto de ensino/aprendizagem da arte.
 Apesar da Proposta Triangular ser muito clara, a má interpretação de seus conceitos por parte de alguns educadores tem causado precipitações na sua aplicação. Entre os erros mais comuns estão: o entendimento limitador de contextualização como contexto histórico, e a confusão e aproximação entre os termos de releitura e cópia.
 Em relação a contextualização, é importante lembrarmos que a arte, além de ser fruto de seu tempo produzida por artistas/autores, é uma área de conhecimento transdisciplinar, ou seja, está em constante diálogo com o mundo e suas diversas áreas de conhecimento como podemos ver nessa passagem de Ana Mae:

 A metodologia de análise deve ser de escolha do professor e do fruidor, o importante é que obras de arte sejam analisadas para que se aprenda a ler a imagem e avaliá-la; esta leitura é enriquecida pela informação acerca do contexto histórico, social, antropológico etc. (BARBOSA, 2009, p. 39)


Observando atividades de ensino/aprendizagem em arte constata-se que além dessa limitação de contextualização ao contexto histórico alguns educadores entendem a tríade leitura, contextualização e fazer como elementos complementares que acontecem em momentos completamente separados. Esses elementos são sim complementares, mas não precisam necessariamente acontecer em momentos separados, a própria obra carrega contextualização e durante a leitura feita com os(as) educandos(as) é possível contextualizar preparando para o fazer. Essa percepção das pontas do triangulo conceitual da abordagem como elementos completamente separados faz com que os momentos de leitura, contextualização e prática aconteçam também dessa maneira, como se não existisse uma interligação entre esses processos, dificultando a compreensão do conteúdo por parte dos(as) educandos(as) e causando um engessamento da proposta pedagógica. Os educadores precisam compreender que “não se tratam de fases da aprendizagem, mas de processos mentais que se interligam para operar a rede cognitiva da aprendizagem” (BARBOSA, 1998, p.40). Esse engessamento causado pela separação da tríade conceitual e a limitação da contextualização ao contexto histórico causa uma percepção errônea da Proposta Triangular como cópia do DBAE por aproximar as duas propostas uma vez que o segundo propõe estética crítica e história da arte como disciplinas separadas a serem estudadas em momentos distintos como se não existisse relação entre as duas disciplinas.
 Durante os processos de leitura, contextualização e prática, mesmo que esses aconteçam em momentos distintos, e isso é natural que aconteça, para uma melhor compreensão do conteúdo por parte dos(as) educandos(as), é importante não existir barreiras definidas entre esses momentos fazendo relações entre um e outro o tempo todo mantendo uma dialógica entre esses conceitos deixando claro que são inter-relacionados.
 Já sobre a confusão entre os conceitos de releitura e cópia me parece uma total incompreensão dos termos. Cópia é o ato de reproduzir de forma mais fiel possível manualmente ou através de equipamentos que nos permitam fazer isso, como a copiadora, por exemplo, algo. A cópia quando feita manualmente pode colaborar para o desenvolvimento de habilidades técnicas, mas não diferenciar cópia de releitura é limitar a produção criativa dos(as) educandos(as) ao fazer por fazer, ou seja, ao tecnicismo inibindo o desenvolvimento estético e conceitual dos(as) educandos(as).  Já releitura como a palavra já diz é o ato de reler, reinterpretar, resignificar, recompor, citar, remixar, se apropriar de produções estéticas de outros indivíduos, ou seja, se apropriar de uma ou inúmeras referências e fazer a sua maneira.
 O Hip Hop parece ter um especial potencial esclarecedor entre as diferenças desses dois termos (cópia e releitura) uma vez que suas manifestações artísticas se valem muito da apropriação das produções de outros, seja na dança, na música e no Graffiti ou pixação. A música RAP geralmente feita com samplers[2] em repetições cíclicas, se analisada comparativamente com a música original, ou seja, a matriz apropriada para a produção do RAP, parece ser um exemplo perfeito para esclarecermos as diferenças entre os dois termos em questão. Deixo duas músicas de sugestão para uma análise comparativa: Ela Partiu de Tim Maia e Um Homem na Estrada do grupo Racionais MC’s e as obras Las meninas de Velásquez (1656) e uma das 44 releituras de mesmo nome feitas por Pablo Picasso a partir de 1950.
Por que a confusão entre dois conceitos tão diferentes como os de cópia e releitura? Dois problemas fundamentais do ensino automatizado parecem contribuir para a indistinção entre esses dois termos (cópia e releitura) e muitos outros. Um dos problemas que contribuem para essa causa, já foi comentado anteriormente, é que a maioria da população ainda não sabe ler criticamente as imagens. O outro é o de ler e não compreender criticamente textos, um velho problema que atinge grande parte da população, inclusive educadores(as) como a indistinção entre esses os dois termos em discussão, cópia e releitura, nos comprova. Não é possível encontrar outra explicação, já que lendo o livro A imagem no ensino da arte de Ana Mae não lembro, se quer, ter me deparado com esses termos.
Paulo Freire há muito tempo vem chamando a atenção para o problema do ensino/aprendizagem da leitura e escrita a partir de métodos “bancários” de repetição que fazem com que os(as) educandos(as) memorizem a palavra e não realmente compreendam seu significado. Ou seja, os(as) educandos(as) (re)conhecem a palavra como imagem, mas não o seu significado, e quando se deparam com textos e conceitos encontram dificuldade de interpretar e compreender seus significados criticamente. Se os(as) educadores(as) de hoje foram os(as) educandos(as) de ontem ensinados a partir de métodos “bancários”, infelizmente, é muito provável, e até “natural”, que sofram desse mal e o repasse para seus aprendizes.


Daí a impossibilidade de vir a se tornar um professor crítico, se mecanicamente memorizador, é muito mais um repetidor cadenciado de frases e de ideias inertes do que um desafiador. O intelectual memorizador, que lê horas a fio, domesticando-se ao texto temeroso de arriscar-se, fala de suas leituras quase como se estivesse recitando-as de memória – não percebe, quando realmente existe, nenhuma relação com o que leu e o que vem ocorrendo em seu país, na sua cidade, no seu bairro. Repete o lido com precisão mas raramente ensaia algo pessoal. Fala bonito de dialética mas pensa mecanicistamente. Pensa errado. É como se os livros todos cuja leitura dedica tempo farto nada devessem ter com a realidade de seu mundo. (FREIRE, 1996, p. 27).


Essa indistinção entre cópia e releitura ocorre quando o(a) educador(a) recebe a Proposta Triangular mecanicamente, e sem a reflexão crítica a transforma numa fórmula estática deixando assim de ser proposta para se tornar uma regra a ser seguida sem questionamento. Quando o(a) leitor(a) não problematiza durante a leitura, não reflete. E sem reflexão não há consciência crítica e sem consciência crítica sobre a proposta, ou seja, qual for o conteúdo, o(a) educador(a) não conseguirá explorar todo seu potencial a limitando. A Abordagem Triangular e nenhuma outra proposta e/ou conceito deve ser recebido pelo(a) leitor(a) de forma automatizada.
E além de refletir sobre a abordagem, todo(a) educador(a) deve refletir sobre a escola e o contexto no qual essa está inserida (a comunidade), a atividade que pretende propiciar e o coletivo de educandos(as), e indivíduos deste coletivo, ao qual essa atividade é direcionada. Ou seja, toda ação educativa deve ser planejada. O(A) educador(a) deve se colocar dentro da realidade em que ele(a), a escola, e os(as) educandos(as) estão inseridos(as) de forma crítica. Deve conhecer a comunidade da qual a instituição faz parte, observar como a instituição se porta diante desse contexto sociocultural e como os(as) educandos(as) e membros da comunidade se portam diante da escola e de sua própria comunidade, para que assim, possa por em prática de forma funcional a sua ética educativa e/ou profissional.

 





[1] A Proposta ou Abordagem Triangular também é conhecida como Metodologia Triangular (termo hoje revisado e repudiado pela autora).
[2]  Trechos de músicas de outros compositores.

 Bibliografia





[1] A Proposta ou Abordagem Triangular também é conhecida como Metodologia Triangular (termo hoje revisado e repudiado pela autora).
[2]  Trechos de músicas de outros compositores.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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SEVERINO, Antonio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. - São Paulo: Cortez, 2007, 23ª ed.


DISCOGRAFIA

A FIRMA. Espaço RAP vol. 2. São Paulo: Sky Blue Music, 1999. CD. Faixa 5.


CONSCIÊNCIA HUMANA. Projeto RAP Brasil. São Paulo: Atração, 1992. 1 disco sonoro.


CONSCIÊNCIA X ATUAL. Contos do Crime. Ribeirão Preto: Discovery discos, 2000. CD. Faixa 11.


FILOSOFIA DE RUA. Valeu a Experiência. São Paulo: N. World Produções, 1994. CD. Faixa 8.

FORA DE FREQUÊNCIA. Prefiro Acreditar. São Paulo: independente, 2010. CD.


O RAPPA. LadoB LadoA. Rio de Janeiro: WEA, 1999. CD. Faixa 6.
P.MC E POETAS DE RUA. Dose Dupla. TNT Record’s, 1996. CD. Faixa 12.


RACIONAIS MC’S. Sobrevivendo no inferno. São Paulo: Cosa Nostra, 1998. CD. Faixa 3.


THAÍDE E DJ HUM. Preste Atenção. São Paulo: Eldorado, 1996. CD. Faixa 4.
_______________. Hip Hop Cultura de rua. Eldorado, 1988. (Col.). 1 disco sonoro.


REFERÊNCIAS AUDIOVISUAIS

BASKIAT. Direção de Julian Schnabel. Produzido por Jon Kilik, Randy Ostrow e Sigurjon Sighvatsson. EUA, 1996. DVD 108 min.


CADILLACS Records. Direção de Darnell Martin. Sony Pictures. EUA, 2008. DVD 109 min.


É TUDO NOSSO: o Hip Hop fazendo história. Produção de Toni C. Brasil: Associação Vermelho, 2007. DVD 180 min.


MALCON X. Direção de Spike Lee. Produção de 40 Acres & a Mule Filmworks / JVC Entertainment / Largo International N.V. EUA, 1992. DVD 202 min.


OS PANTERAS Negras. Direção de Mario Van Peebles. EUA: Polygram Filmed Entertainment, 1995. DVD 123 min.


QUILOMBO. Direção de Carlos Diegues. CDK. Brasil, 1984. DVD 119 min.