quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Museu não é céu e curadores não são "deuses"

Por: Anderson Benelli
No dia 07 de novembro estive no MAM em visita a 31ª edição do Panorama da arte brasileira com o subtítulo em tupi antigo: Mamõyguara opá mamo pupé que significa “gente tem estrangeiro em todo lugar” com curadoria de Adriano Pedrosa. A 31ª edição do Panorama causou polêmica ao propor uma exposição sobre arte brasileira com maioria esmagadora de artistas estrangeiros, com exceção de uma artista nascida no Brasil, mas que vive no exterior e de uma Argentina que vive no Brasil a mais de vinte anos. Fazendo uma relação de opostos, uma estrangeira com um tempero brasileiro no olhar e uma brasileira com um tempero estrangeiro. Mesmo com a maioria de estrangeiros compondo o panorama, ao meu ver, o objetivo de rever e discutir a arte brasileira foi alcançado com sucesso, a influência da arte brasileira sobre o olhar estrangeiro está clara no panorama. As referências e citações aos artistas brasileiros são evidentes, principalmente aos neoconcretistas, além do próprio título do panorama fazer alusão ao pensamento antropofágico (tupi or not tupi) de Oswald de Andrade. E até algumas “cópias” ou “aquisições” como as obras da artista Sandra Gamarra do Peru, a única diferença de uma cópia no sentido literal da palavra é que a reprodução faz parte do conceito da artista. Em um de seus trabalhos ela expõe uma reprodução pintada da obra do brasileiro Vik Muniz, que se apropriou de uma fotografia que representa Pollock no ato de uma de suas criações e transformou em uma pintura de chocolate que é exposta como fotografia. Ou seja, Vik Muniz se apropriou de uma fotografia transformou em pintura e devolveu
como fotografia. Já Gamarra se apropriou da pintura apropriada de uma fotografia e exposta como fotografia e devolveu como pintura. Ou seja, a obra de Muniz é efêmera e o que é exposto nada mais é que uma representação da obra que é aceita como a própria obra (que por ser uma fotografia pode ser reproduzida inúmeras vezes), e se uma representação é aceita como obra por que uma reprodução exposta como obra não pode ser aceita como arte? Parece-me uma discussão válida.
Mas o que realmente me chamou atenção, e me causou indignação, foi o modo como a obra de Gabriel Sierra (Colômbia) está exposta. A obra é uma citação aos Bichos de Lygia Clark e também traz a possibilidade do espectador recompor a obra, mas está cercada de adesivos dizendo: “não toque”. Se Adriano Pedrosa, um dos mais conceituados curadores brasileiros, comete uma barbárie dessas, isso mostra que “a arte... não precisa dos museus para existir; ela precisa de redes e de tecidos sociais que suportem seus conteúdos” (Gabriel Sierra). Os museus se preocupam tanto com a conservação da obra de arte que a transformam em um objeto sagrado a ser adorado que não pode ser alcançado (no caso tocado) pelo espectador,

desrespeitando o artista e matando a arte, assim como vez Pedrosa. Quando o curador coloca a si e o objeto acima de seu criador, desrespeitando o propósito ao qual foi criado e o “endeusando”, ele mata a arte existente neste objeto e a preocupação em conservá-lo como objeto sagrado a ser adorado só o anula transformando-o em lixo. Se um homem que se coloca acima da própria arte (que também não é, e nem deve ser vista como, Deus) como um "deus”, e ao meu ver não entende nada de arte, é considerado um dos mais conceituados curadores brasileiros estamos em maus lençóis. Só quero lembrar que museu não é céu e curadores (e nem pessoa alguma na humanidade) não são "deuses” são meros operários a serviço da arte, são apenas animais que cagam.